A Deficiência e os Vários Tipos Existentes

Gilson de Souza DANIEL (Cascavel Pr Brazil)

Qual o significado da palavra “deficiência”?

Segundo a Organização Mundial de Saúde, deficiência é o substantivo atribuído a toda a perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatómica. Refere-se, portanto, à biologia do ser humano.

Quem pode ser considerado deficiente?]

A expressão “pessoa com deficiência” pode ser atribuída a pessoas portadoras de qualquer tipo(s) de deficiência. Porém, em termos legais, esta mesma expressão é aplicada de um modo mais restrito e refere-se a pessoas que se encontram sob o amparo de determinada legislação.

É designado “deficiente” todo aquele que tem um ou mais problemas de funcionamento ou falta de parte anatómica, embargando com isto dificuldades a vários níveis: de locomoção, percepção, pensamento ou relação social.

Até bem recentemente, o termo “deficiente” era vulgarmente aplicado a pessoas portadoras de deficiência(s). Porém, esta expressão embarga consigo uma forte carga negativa depreciativa da pessoa, pelo que foi, ao longo dos anos, cada vez mais rejeitada pelos especialistas da área e, em especial, pelos próprios portadores.

Actualmente, a palavra é considerada comoinadequada e estimuladora do preconceito a respeito do valor integral da pessoa. Deste modo, a substitui-la surge a expressão: “pessoa especial”.

Quais os vários tipos de deficiência?

A pessoa especial pode ser portadora de deficiência única ou de deficiência múltipla (associação de uma ou mais deficiências). As várias deficiências podem agrupar-se em quatro conjuntos distintos, sendo eles:

Deficiência visual
Deficiência motora
Deficiência mental
Deficiência auditiva
Paralisia cerebral

Deficiência Visual
Visão
A visão é um dos sentidos que nos ajuda a compreender o mundo à nossa volta, ao mesmo tempo que nos dá significado para os objectos, conceitos e ideias.
A comunicação por meio de imagens e elementos visuais relacionados é denominada “comunicação visual”. Os humanos empregam-na desde o amanhecer dos tempos. Na realidade, ela é predadora de todas as linguagens escritas.

Deficiência Visual
Deficiência visual é a perda ou redução da capacidade visual em ambos os olhos, com carácter definitivo, não sendo susceptível de ser melhorada ou corrigida com o uso de lentes e/ou tratamento clínico ou cirúrgico.
De entre os deficientes visuais, podemos ainda distinguir os portadores de cegueira e os de visão subnormal.

Causas da Deficiência Visual
• Congénitas: amaurose congénita de Leber, malformações oculares, glaucoma congénito, catarata congénita.
• Adquiridas: traumas oculares, catarata, degeneração senil de mácula, glaucoma, alterações relacionadas à hipertensão arterial ou diabetes.

Como identificar?
• Desvio de um dos olhos;
• Não seguimento visual de objectos;
• Não reconhecimento visual de pessoas ou objectos;
• Baixo aproveitamento escolar;
• Atraso de desenvolvimento.

Sinais de alerta
• Olhos vermelhos, inflamados ou lacrimejantes;
• Pálpebras inchadas ou com pus nas pestanas;
• Esfregar os olhos com frequência;
• Fechar ou tapar um dos olhos, sacode a cabeça ou estende-a para a frente;
• Segura os objectos muito perto dos olhos;
• Inclina a cabeça para a frente ou para trás, pisca ou semicerra os olhos para ver os objectos que estão longe ou perto;
• Quando deixa cair objectos pequenos, precisa de tactear para os encontrar;
• Cansa-se facilmente ou distrai-se ao aplicar a vista muito tempo.

Consequências da Baixa Visão
Percepção Turva
• Os contrastes são poucos perceptíveis;
• As distâncias são mal apreciadas;
• Existe uma má percepção do relevo;
• As cores são atenuadas.

Escotoma Central e Visão Periférica
• Funciona apenas a retina periférica, que não é tão
discriminativa, pelo que pode ser necessária a ampliação
da letra para efeitos de leitura;
• É em geral impeditiva das actividades realizadas com proximidade dos restantes elementos ,bem como da leitura;
• Apresenta acuidade visual baixa (cerca de 1/10).

Visão Tubular
• A retina central funciona, podendo a acuidade visual ser normal;
• A visão nocturna é reduzida, pois depende funcionalmente da retina periférica;
• Podendo não limitar a leitura, é muito limitativa das actividades de autonomia.

Patologias que conduzem à baixa visão
Atrofia do Nervo Óptico:
• Degenerescência das fibras do nervo óptico. Se for total, não há percepção luminosa.

Alta miopia:
• Baseia-se num defeito de refracção elevado (> a 6 dioptrias), que frequentemente é hereditário, associado a outros aspectos degenerativos. O risco do deslocamento da retina é elevado, nesse caso, devem ser tomadas precauções necessárias.

Cataratas Congénitas:
• Perda de transparência do cristalino, originando perturbações na diminuição da acuidade visual. A visão periférica também está normalmente afectada, daí existir uma grande dependência na funcionalidade e na autonomia.

Degeneração macular:
• Situa-se, na zona central da retina, mácula, e constitui uma das causas mais frequentes de dependência visual ligada à idade. Outras patologias surgem em escalões etários mais jovens (ex.: queimadura da mácula – eclipse solar). A visão periférica não sofre alterações pelo que não há problemas na mobilidade. A visão central é afectada por escotomas que podem progredir.

Glaucoma:
• É uma patologia do olho em que a pressão intra-ocular é elevada por produção excessiva ou deficiência na drenagem do humor aquoso.
• O glaucoma agudo é mais raro, doloroso e normalmente implica intervenção cirúrgica no seu tratamento.

Outras Retinopatias
• Degenerescência da retina que poder ser hereditária ou não. Envolve perda de visão e consequentes problemas na mobilidade, ficando a pessoa com visão tubular.

Síndroma USHER
• Associa a retinopatia pigmentar à patologia auditiva, afectando simultaneamente a visão e a audição.

Doença de Stargardt
• Consiste em diversos escotomas do centro para a periferia da retina, mantendo-se quase sempre um ilhéu central de visão.

O aluno deficiente visual…

Características da Criança Deficiente Visual
– A criança deficiente visual é aquela que difere da média, a tal ponto que irá necessitar de professores especializados, adaptações curriculares e ou materiais adicionais de ensino, para ajudá-la a atingir um nível de desenvolvimento proporcional às suas capacidades;
•Os alunos com deficiência visual não constituem um grupo homogéneo;
• Os portadores de deficiência visual apresentam uma variação de perdas que se poderão manifestar em diferentes graus de acuidade visual;

Adaptações educacionais para os Deficientes Visuais
• A educação da criança deficiente visual pode se processar por meio de programas diferentes, desenvolvidos em classes especiais ou na classe comum, recebendo apoio do professor especializado;
• As crianças necessitam de uma boa educação geral, somada a um tipo de educação compatível com seus requisitos especiais, fazendo ou não, uso de materiais ou equipamentos de apoio.
• A educação do deficiente visual necessita de professores especializados nesta área, métodos e técnicas específicas de trabalho, instalações e equipamentos especiais, bem como algumas adaptações ou adições curriculares;
• A tendência actual da educação especial é manter na escola comum o maior número possível de crianças com necessidades educativas especiais;
• Cabe à sociedade a responsabilidade de prover os auxílios necessários para que a criança se capacite e possa integrar-se no grupo social.

Princípios da Educação do Deficiente Visual
• Individualização
• Concretização
• Ensino Unificado
• Estímulo Adicional
• Auto-Actividade

Estimulação dos sentidos:
• Estimulação visual
• Estimulação do tacto
• Estimulação auditiva
• Estimulação do olfacto e do paladar

Estimulação visual
• Motivar a criança a alcançar, tocar, manipular e reconhecer o objecto;
• Ensinar a “olhar” para o rosto de quem fala;
• Ajustar uma área onde a criança possa brincar em segurança e onde os objectos estejam ao alcance dos seus braços;
• O educador pode usar fita-cola de diferentes cores para contrastarem com os objectos da criança, de modo a torná-los mais visíveis.

Estimulação do tacto
• Descriminar diferentes texturas;
• Experimentar materiais com formas e feitios com contornos nítidos e cores vivas;
• Distinguir a temperatura dos líquidos e sólidos;
• Mostrar como pode manipular o objecto.

Estimulação auditiva
• Ouvir barulhos ambientais, gravadores, rádios…;
• Identificar sons simples;
• Distinguir timbres e volumes dos sons;
• Discriminar a diferença entre duas frases quase iguais;
• Desenvolver a memória auditiva selectiva.

Estimulação do olfacto e do paladar
• Provar e cheirar diferentes comidas (salgadas, doces e amargas);
• Cheirar vinagre, perfumes, detergentes, sabonetes e outros líquidos com cheiros fortes.

Programa pré-escolar
Quando em idade pré-escolar, a criança deficiente visual necessita que se dê importância à “rapidez,” para que atinja o mesmo nível que os colegas normo-visuais.
Para tal é particularmente importante que ela desenvolva :
• capacidades motoras ;
• capacidades da linguagem;
• capacidades discriminativas e perceptivas .

Entrada para a escola
À entrada para a escola a Criança D.V. deve:
• Compreender o seu corpo;
• Ter a lateralidade desenvolvida;
• Estar desenvolvido no Tacto;
• Estar desenvolvido auditivamente

Reabilitação
A Reabilitação é essencial no processo de inserção na sociedade, dado que a redução ou a privação da capacidade de ver traz consequências para a vida do indivíduo, tanto no nível pessoal como no funcional, colocando-o, na maioria das vezes, à margem do processo social, segurança psicológica e nas habilidades básicas;

Sala de recursos
• Estas salas podem estabelecer uma alternativa de qualidade se tivermos em conta determinadas características, tais como:
• necessidade de um apoio individualizado;
• necessidade de um currículo com objectivos funcionais;
• ambientes estruturados e securizantes;
• equipamentos e materiais específicos;
• problemas de saúde graves;
• necessidade de gestão de tempos específicos.

Currículo escolar e a deficiência visual
• Os programas educativos direccionados para os deficientes visuais devem ir ao encontro das mesmas áreas e actividades que se encontram nos programas regulares(sendo feitas adaptações consoante as necessidades e dificuldades dos alunos).

O reforço pedagógico e a coordenação Técnico – Docente
• Ajuste do tempo ao seu ritmo de trabalho;
• Planificação de Actividades;
• Adaptação do Processo de Avaliação.

Orientação e movimentação da Criança com D.V. no espaço
• Processo prolongado e sequenciado que deve começar o mais cedo possível.
– As técnicas mais utilizadas são:
• Guia normovisual;
• Uso da bengala;
• Cão Guia;
• Etc.

A aprendizagem da criança com deficiência visual
• A capacidade de aprendizagem de uma criança não está directamente relacionada com o seu grau de visão;
• Depende do momento em que a criança perdeu a visão.

Adaptação do Espaço
• Serão necessárias adaptações no espaço se a dificuldade de visão for acrescida de outras;
– Conhecer o ambiente escolar;
– Na sala de aula é necessário:
• Comunicação Oral;
• Condições de iluminação;
• Organização do espaço e dos materiais;
• Estratégias e recursos.

Avaliação Clínica
– A Equipa deve ser constituída por:
• Professor do Ensino regular;
• Serviços Especializados de A.E.;
• Oftalmologista;
• Ortoptista;
• Técnico de Reabilitação;
• Psicólogo;
• Técnico de Serviço Social;

Avaliação funcional
• Consiste em avaliar os aspectos funcionais da visão e as suas implicações educacionais;
• Ocorre em contextos naturais e implica recolha de elementos relativos à forma como a pessoa utiliza a sua visão em ambientes com condições diferentes;

Avaliação
• A avaliação deve ter em conta:
– Idade do início das dificuldades visuais;
– Modo de progressão da perda de visão- lento ou abrupto;
– Causa dessas dificuldades – sistémica (ex. diabetes), ou confinada ao olho;
– Se a patologia é hereditária, congénita, ou adquirida (antes dos 5 anos ou após este período);
– Se o prognóstico é estacionário ou evolutivo.

• A avaliação para ser eficaz deve:
– Utilizar formas de comunicação que a criança/jovem compreenda;
– Incluir objectos e materiais familiares interessantes;
– Apresentar esses materiais e objectos de forma contextualizada, baseada numa aprendizagem significativa e estruturada;
– Organizar e provocar situações de aprendizagem estruturada mediante a utilização de objectos e materiais, apresentados em contextos naturais.

Deficiência Motora

O que é a deficiência motora?
Deficiência motora é uma disfunção física ou motora, a qual poderá ser de carácter congénito ou adquirido.
Desta forma, esta disfunção irá afectar o indivíduo, no que diz respeito à mobilidade. À coordenação motora ou à fala. Este tipo de deficiência pode decorrer de lesões neurológicas, neuromusculares, ortopédicas e ainda de mal formação.

Quem pode ser considerado deficiente motor?
Considera-se deficiente motor todo o indivíduo que seja portador de deficiência motora, de carácter permanente, ao nível dos membros superiores ou inferiores, de grau igual ou superior a 60% (avaliada pela Tabela Nacional de Incapacidades, aprovada pelo decreto de lei nº 341/93, 30 de Setembro).
Para além disso, para ser titular deste nome, é necessário que essa deficiência dificulte, comprovadamente, a locomoção na via pública sem auxílio de outrem ou recurso a meios de compensação, bem como o acesso ou utilização dos transportes públicos.

Quem pode ser considerado portador de multideficiência profunda?
É considerado portador de multideficiência profunda todo aquele que tenha uma deficiência motora de carácter permanente, ao nível dos membros inferiores ou superiores, de grau igual ou superior a 60%, e contenha, cumulativamente, deficiência sensorial, intelectual ou visual de carácter permanente, daí resultando um grau de desvalorização superior a 90% e que, deste modo, esteja comprovadamente de conduzir veículos automóveis.

Como pode ser comprovada a deficiência? As declarações de incapacidade das deficiências motora ou multideficiência podem ser emitidas por:
•Juntas médicas, nomeadas pelo Ministro da Saúde nos casos de pessoa com deficiências civis;
•Direcções dos serviços competentes de cada um dos ramos das Forças Armadas;
•Comandos-Gerais da Guarda Nacional Republicana e da Policia de Segurança Pública.

Quais as causas da deficiência motora?
São vários os motivos que podemos encontrar na base da deficiência motora, destacando-se as seguintes:
• Acidentes de trânsito;
• Acidentes de trabalho;
• Erros médicos;
• Problemas durante o parto;
• Violência;
• Desnutrição
• Etc.

Quais os vários tipos de deficiência motora?
•Monoplegia
•Hemiplegia
•Paraplegia
•Tetraplegia
•Amputação

Distinção entre os vários tipos:
•monoplegia: paralisia em um membro do corpo;
• hemiplegia: paralisia na metade do corpo;
• paraplegia: paralisia da cintura para baixo;
• tetraplegia: paralisia do pescoço para baixo;
• amputado: falta de um membro do corpo.

Medidas preventivas:
• Maior consciencialização por parte das mulheres acerca da necessidade de fazer acompanhamento médico pré-natal;
• Existirem mais pessoas treinadas no resgate de vitimas de acidentes de transito;
• Consciencialização dos riscos da hipertensão e da diabetes;

O aluno portador de deficiência motora e a escola…
Dentro da sala de aula:
• Deverão ocupar um lugar relativamente próximo do professor
• Aqueles que necessitem de usar cadeira de rodas, devem ter mesas adaptadas, mais alta do que a dos colegas
• A incontinência é um dos obstáculos mais desagradáveis, o professor deverá estar a par do problema e explicar aos outros alunos a situação.
• Deverá portanto ter em atenção os horário de evacuação da criança para que não surjam situações embaraçosas

O papel do professor:
• Especialização por parte do professor;
• Pesquisa intensiva;
• Inter-ajuda entre pais e professores;
• Ajudar na relação entre os alunos;
• Esclarecimento do problema do aluno;
• Estimular o aluno;

“Lutar pelos direitos dos deficientes é uma forma de superar as nossas próprias deficiências” J.F.Kennedy

A escola é muito importante para qualquer criança, tendo mais importância ainda, para uma criança portadora de necessidades especiais. É na escola que aos poucos a criança adquire confiança em si mesma.

Comportamentos que devemos evitar e que devemos promover nos alunos com deficiência motora
• Devemos promover o máximo de independência no âmbito das capacidades e limitações do aluno, mas atendendo sempre às necessidades inerentes a cada caso de deficiência, pois cada caso é um caso e deve-se encontrar sempre uma solução específica adequada.
• Não se deve fazer de conta que estas pessoas não existem, pois se o fizermos vamos estar a ignorar uma característica muito importante dessa pessoa e, se não a virmos da forma como ela é, não nos estaremos a relacionar com a pessoa “verdadeira”, mas sim com outra pessoa que foi inventada por nós próprios.
• Quando se conversa com um aluno em cadeira de rodas, devemo-nos lembrar sempre que, para eles é extremamente incómodo conversar com a cabeça levantada, sendo por isso melhor sentarmo-nos ao seu nível, para que o aluno se possa sentir mais confortável.
• Sempre que haja muita gente em corredores, bares, restaurantes, shopings etc e estivermos a ajudar um colega em cadeira de rodas, devemos avançar a cadeira com prudência, pois a pessoa poder-se-á sentir incomodada, se magoar outras pessoas.
• As maiores barreiras não são arquitectónicas, mas sim a falta de informação e os preconceitos.

Deficiência Mental
Inteligência…
Definição de inteligência: “capacidade para aprender, capacidade para pensar abstractamente, capacidade de adaptação a novas situações” e “conjunto de processos como memória, categorização, aprendizagem e solução de problemas, capacidade linguística ou de comunicação, conhecimento social…”(Sainz e Mayor).

Deficiência Mental
Conceito:
Deficiência mental é a designação que caracteriza os problemas que ocorrem no cérebro e levam a um baixo rendimento, mas que não afectam outras regiões ou áreas cerebrais.

Quem pode ser considerado deficiente mental?
Deficiente mental são “todas as pessoas que tenham um QI abaixo de 70 e cujos sintomas tenham aparecido antes dos dezoito anos considera-se que têm deficiência mental.” – Paula Romana.
Segundo a vertente pedagógica, o deficiente mental será o indivíduo que tem uma maior ou menor dificuldade em seguir o processo regular de aprendizagem e que por isso tem necessidades educativas especiais, ou seja, necessita de apoios e adaptações curriculares que lhe permitam seguir o processo regular de ensino.

Graus de deficiência mental
Embora existam diferentes correntes para determinar o grau de deficiência mental, são as técnicas psicométricas que mais se impõem, utilizando o QI para a classificação desse grau.
O conceito de QI foi introduzido por Stern e é o resultado da multiplicação por cem do quociente obtido pela divisão da IM (idade mental) pela IC (idade cronológica).Segundo a OMS, a deficiência
divide-se:
– Profunda:
• Grandes problemas sensorio-motores e de comunicação,bem como de comunicação com o meio;
• São dependentes dos outros em quase todas as funções e actividades, pois os seus handicaps físicos e intelectuais são gravíssimos;
• Excepcionalmente terão autonomia para se deslocar e responder a treinos simples de auto-ajuda.

– Grave/severa:
• Necessitam de protecção e ajuda, pois o seu nível de autonomia é muito pobre;
• Apresentam muitos problemas psicomotores;
• A sua linguagem verbal é muito deficitária – comunicação primária;
• Podem ser treinados em algumas actividades de vida diária básicas e em aprendizagens pré-tecnológicas simples;

– Moderado/média:
• São capazes de adquirir hábitos de autonomia pessoal e social;
• Podem aprender a comunicar pela linguagem oral, mas apresentam dificuldades na expressão e compreensão oral;
• Apresentam um desenvolvimento motor aceitável e têm possibilidade para adquirir alguns conhecimentos pré-tecnológicos básicos que lhes permitam realizar algum trabalho;
• Dificilmente chegam a dominar as técnicas de leitura, escrita e cálculo;

– Leve/ligeira:
• São educáveis;
• Podem chegar a realizar tarefas mais complexas;
• A sua aprendizagem é mais lenta, mas podem permanecer em classes comuns embora precisem de um acompanhamento especial;
• Podem desenvolver aprendizagens sociais e de comunicação e têm capacidade para se adaptar e integrar no mundo laboral;
• Apresentam atraso mínimo nas áreas perceptivas e motoras;
• Geralmente não apresentam problemas de adaptação ao ambiente familiar e social.

Etiologia/Causas e factores de risco
É importante alertar que, muitas vezes, apesar da utilização de recursos sofisticados na realização do diagnóstico, não se chega a definir com clareza a causa de deficiência mental.

Factores Genéticos
Estes factores actuam antes da gestação; a origem da deficiência está já determinada pelos genes ou herança genética. São factores ou causas de tipo endógeno (actuam no interior do próprio ser).
Existem dois tipos de causas genéticas:
• Geneopatias – alterações genéticas que produzem metabolopatias ou alterações de metabolismo;
• Cromossomopatias – que são síndromes devidos a anomalias ou alterações nos cromossomas.

Factores Extrínsecos
Factores extrínsecos são factores pré-natais, isto é, que actuam antes do nascimento do ser.
Podemos, então, constatar os seguintes problemas:
• Desnutrição materna;
• Má assistência à gestante;
• Doenças infecciosas;
• Intoxicações;
• Perturbações psiquícas;
• Infecções;
• Fetopatias; (actuam a partir do 3º mês de gestação)
• Embriopatias (actuam durante os 3 primeiros meses de gestação)
• Genéticos.
• etc

Factores Perinatais e neonatais
Factores Perinatais ou Neonatais são aqueles que actuam durante o nascimento ou no recém-nascido.
Neste caso, podemos constatar os seguintes problemas:
• Metabolopatias;
• Infecções;
• Incompatibilidade RH entre mãe e recém nascido.
• Má assistência e traumas de parto;
• Hipóxia ou anóxia;
• Prematuridade e baixo peso;
• Icterícia grave do recém nascido (incompatibilidade RH/ABO).

Factores Pós-Natais
Factores pós-natais são factores que actuam após o parto.
Observamos, assim, os seguintes problemas:
• Desnutrição, desidratação grave, carência de estimulação global:
• Infecções;
• convulsões;
• Anoxia (paragem cardíaca, asfixia…)
• Intoxicações exógenas (envenenamento);
• Acidentes;
• Infestações.

Intervenção Pedagócica
No desenvolvimento de um indivíduo deficiente mental, deparamo-nos com várias dificuldades, sendo elas:
• Psicomotoras;
• Sensoriais;
• Nas relações sociais;
• De autonomia;
• De linguagem.

No momento de planificar qualquer intervenção educativa, devemos pensar nessas dificuldades e, consoante as possibilidades e limitações de cada indivíduo, estabelecer o programa mais adaptado.

Além de conhecer o estado geral do seu desenvolvimento e as dificuldades específicas apresentadas, deveremos atender também às capacidades de aprendizagem de cada um, para evitar que os objectivos educativos não sejam nem demasiado exigentes, a ponto de o aluno não poder atingi-los, nem tão simples, que não favoreçam ao máximo o desenvolvimento das suas potencialidades.
•Em primeiro lugar, a criança deficiente tem dificuldade em estruturar as suas experiências.
A aquisição de capacidades perceptivo-motoras não terá a mesma significação que têm para a maioria dos indivíduos da sociedade a que pertencem.

• É difícil comunicar com estas crianças porque, por um lado, teremos de entrar no seu mundo de objectos e representações e, por outro, no mundo das pessoas normais existe um campo de experiências que estão fora do alcance da criança deficiente.

Esta dificuldade para estabelecer comunicação faz com que o tipo de educação que lhes damos, deva basear-se numa série de estratégias que permitam educar a percepção, motricidade e linguagem e que consistirão no treino da capacidade para efectuar as diferenciações e as estruturações necessárias para que as aprendizagens escolares possam revestir-se de significado para a criança e possam chegar a ser objectos, ou seja, possam fazer parte não apenas do seu meio ambiente mas também do seu próprio meio.

• A criança deficiente mental não possui determinados meios para poder afirmar-se como pessoa e, por conseguinte, está sujeita a não ser respeitada e a ser tratada, por vezes, como um objecto. Para isso, contribui uma série de factores que passaremos a referir: os pais não devem deixar que a criança não faça nada, pois isso prejudica o desenvolvimento da sua autonomia pessoal; outro aspecto em que é preciso ajudar o deficiente mental é na integração do seu esquema corporal, pois se não conseguir compreender os termos que simbolizam as relações espaciais, não poderá compreender os sistemas convencionais que regulam a vida social e viverá à margem desta e muitas ocasiões.
• A atitude perante o deficiente mental deve ser sempre de aceitação da sua pessoa tal como é; esta atitude deveria ser adoptada por toda a sociedade, mas muito especialmente por pais e educadores.

A educação…
A educação em casa
O período educativo, em que as crianças estão permanentemente em contacto com os pais ou em creches ou amas, corresponde às primeiras etapas da sua vida, é da maior importância no seu desenvolvimento.
É importante que estes recebam apoio e orientações necessárias sobre as possibilidades de desenvolvimento da criança, para que assim, possam favorecê-las desde o princípio:
• o meio ambiente tem uma enorme influência na aprendizagem, através da estimulação directa ou indirecta que é dada à criança;
• os primeiros anos da infância são o período mais favorável para a estimulação, visto corresponderem à fase da vida em que o desenvolvimento psicofísico é mais acelerado;
• tudo o que a educação pode oferecer à criança nestas idades requer menor esforço educativo do que nas idades posteriores.

A educação precoce deverá fomentar todos os aspectos do desenvolvimento, como:
• Motricidade;
• Percepção;
• Linguagem;
• Socialização;
• Afectividade.

A Educação Pré-escolar
Antes da integração da pessoa deficiente mental na escola, é necessário ter em conta os seguintes parâmetros:
• Actuação pedagógica orientada:
• Estimulação e motivação para a aprendizagem e para actividades relacionais;
• Educação sensoriomotora e psicomotora;
• Treino de autonomia e hábitos de higiene;
• Educação rítmica;
• Iniciação à comunicação social;
• Educação verbal elementar.

A Educação na Escola
A educação no período escolar deve investir no desenvolvimento de todas as potencialidades da criança deficiente, com o objectivo de a preparar para enfrentar sozinha o mundo em que tem de viver.
Neste sentido, devem ser favorecidas todas as actividades que a ajudem a adquirir as capacidades necessárias para se desenvolver como ser humano:
• Sociabilização;
• Independência;
• Destreza;
• Domínio do corpo;
• Capacidade perceptiva;
• Capacidade de representação mental;
• Linguagem:
• Afectividade

Deficiência Auditiva
A audição…
A audição, tal como os restantes sentidos, é muito importante para o nosso desenvolvimento como indivíduo, como parte da sociedade.
Já antes do nosso nascimento, a audição é o primeiro sentido a ser apurado, através do diálogo da mãe com o seu bebé, dos novos sons, do conhecimento do mundo que nos rodeia.

É através desta que comunicamos com o mundo e este se comunica connosco, desenvolvendo assim a nossa identidade, os nossos sentimentos, a compreensão do mundo que está à nossa volta, os vínculos sociais, as interacções intra e inter – pessoais e, não esquecendo, o modo como manifestamos os nossos anseios e necessidades.

Definição de Deficiencia Auditiva
A deficiência auditiva, trivialmente conhecida como surdez, consiste na perda parcial ou total da capacidade de ouvir, isto é, um indivíduo que apresente um problema auditivo.

É considerado surdo todo o individuo cuja audição não é funcional no dia-a-dia, e considerado parcialmente surdo todo aquele cuja capacidade de ouvir, ainda que deficiente, é funcional com ou sem prótese auditiva.
A deficiência auditiva é uma das deficiências contempladas e integradas nas necessidades educativas especiais (n.e.e.); necessidades pelas quais a Escola tanto proclama.

Qual a diferença entre surdez e deficiência auditiva?
Por vezes, as pessoas confundem surdez com deficiência auditiva. Porém, estas duas noções não devem ser encaradas como sinónimos.
A surdez, sendo de origem congénita, é quando se nasce surdo, isto é, não se tem a capacidade de ouvir nenhum som. Por consequência, surge uma série de dificuldades na aquisição da linguagem, bem como no desenvolvimento da comunicação.
Por sua vez, a deficiência auditiva é um défice adquirido, ou seja, é quando se nasce com uma audição perfeita e que, devido a lesões ou doenças, a perde. Nestas situações, na maior parte dos casos, a pessoa já aprendeu a se comunicar oralmente. Porém, ao adquirir esta deficiência, vai ter de aprender a comunicar de outra forma.
Em certos casos, pode-se recorrer ao uso de aparelhos auditivos ou a intervenções cirúrgicas (dependendo do grau da deficiência auditiva) a fim de minimizar ou corrigir o problema.

Tipos de deficiência auditiva
• Deficiência Auditiva Condutiva
• Deficiência Auditiva Sensório-Neural
• Deficiência Auditiva Mista
• Deficiência Auditiva Central / Disfunção Auditiva Central / Surdez Central
Deficiência Auditiva Condutiva

A perda de audição condutiva afecta, na maior parte das vezes, todas as frequências do som. Contudo, por outro lado, não se verifica uma perda de audição severa.
Este tipo de perda de capacidade auditiva pode ser causada por doenças ou obstruções existentes no ouvido externo ou no ouvido interno. A surdez condutiva pode ter origem numa lesão da caixa do tímpano ou do ouvido médio.
É vulgar nos adultos a perda de audição condutiva, devido ao depósito de cerúmen (cera) no canal auditivo externo. Nas crianças, a otite média, uma inflamação do ouvido médio, é a causa mais comum de perda de audição condutiva.

Deficiência Auditiva

Sensório-Neural
A perda de audição neurossensorial resulta de danos provocados pelas células sensoriais auditivas ou no nervo auditivo. Este tipo de perda pode dever-se a um problema hereditário num cromossoma, assim como, pode ser causado por lesões provocadas durante o nascimento ou por lesões provocadas no feto em desenvolvimento, tal como acontece quando uma grávida contrai rubéola.
A sujeição a ruídos excessivos e persistentes aumenta a pressão numa parte do ouvido interno – o labirinto – e pode resultar numa perda de audição neurossensorial. Essa perda pode variar entre ligeira e profunda. Nestes casos, o recurso à amplificação do som pode não solucionar o problema, uma vez que é possível que se verifique distorção do som.

Deficiência Auditiva Mista
Na deficiência auditiva mista verifica-se, conjuntamente, uma lesão do aparelho de transmissão e de recepção, ou seja, quer a transmissão mecânica das vibrações sonoras, quer a sua transformação em percepção estão afectadas/perturbadas.
Esta deficiência ocorre quando há alteração na condução do som até ao órgão terminal sensorial ou do nervo auditivo. A surdez mista ocorre quando há ambas as perdas auditivas: condutivas e neurossensoriais.

Deficiência Auditiva Central / Disfunção Auditiva Central / Surdez Central
A deficiência auditiva Central, Disfunção Auditiva Central ou Surdez Central não é, necessariamente, acompanhada de uma diminuição da sensibilidade auditiva. Contudo manifesta-se por diferentes graus de dificuldade na percepção e compreensão das quaisquer informações sonoras. Este tipo de deficiência é determinado por uma alteração nas vias centrais da audição. Tal, decorre de alterações nos mecanismos de processamento da informação sonora no tronco cerebral, ou seja, no Sistema Nervoso Central.

Classificação BIAP
(Bureau International d’Audiophonologic)
Graus de surdez:
– Leve – entre 20 e 40 dB
– Média – entre 40 e 70 dB
– Severa – entre 70 e 90 dB
– Profunda – mais de 90 dB
• 1º Grau: 90 dB
• 2º Grau: entre 90 e 100 dB
• 3º Grau: mais de 100 dB

Como minimizar o problema da deficiência auditiva?
Os progressos tecnológicos dos últimos tempos têm sido pontos bastante rentáveis para as pessoas que apresentam falhas auditivas.
Porém, quanto mais cedo se iniciar o tratamento para estes indivíduos, também melhor serão os resultados, uma vez que quanto mais cedo se iniciar a estimulação do cérebro, melhor será o seu desenvolvimento.
Para minimizar o problema da deficiência auditiva, as pessoas podem recorrer a dois métodos:
• método oralista
• método gestualista
Ou ainda…
•Prótese auditivas
• Equipamentos autónomos de amplificação por frequência modulada

Método Oralista e Método Gestualista
Existem dois métodos fundamentais para melhorar um tratamento na pessoa deficiente auditiva:
• O método oralista, que somente se baseia na aquisição de linguagem oral, sem intervenção de gestos estruturados.
• O método gestualista que, para além de um ensino de linguagem oral, ainda apresenta um sistema estruturado de gestos. Este último baseia-se na defesa da linguagem gestual.

Próteses auditivas e outros equipamentos
Ainda que, por muito cedo a pessoa portadora de deficiência auditiva comece a usar próteses auditivas, estas vão intervir com o seu auto-reconhecimento, com a sua imagem pessoal, afastando-a simbolicamente da comunidade surda, ainda que a língua gestual possa ser a sua língua materna. As próteses auditivas, por serem aparelhos visíveis e facilmente detectáveis à observação directa, farão com que o indivíduo tenha de se adaptar a esta nova realidade, para assim se integrar de uma melhor forma na sociedade.
Contudo, nem sempre isto é conseguido, uma vez que a maior parte das pessoas rejeitam estes aparelhos.
As próteses auditivas são aparelhos que servem para ampliar o som. Contudo, é através do uso e do treino auditivo especializado que se vão conseguindo alcançar alguns resultados.
Toda esta tecnologia que tem vindo a ser falada ao longo dos tempos, tem, gradualmente, vindo a ajudar as pessoas deficientes auditivas, permitindo-nos também dispor de alguns aparelhos de amplificação de sons são bastante úteis.

Existem ainda os equipamentos autónomos de amplificação por frequência modulada, que transmitem o sinal sonoro mediante ondas de alta-frequência.
Estes equipamentos evitam interferências, reduzem o ruído ambiente e eliminam o problema de distância entre interlocutores.
Para o treino da terapia da fala existem amplificadores de bandas de frequência mais especializados, que possuem filtros de frequência que deixam passar somente as frequências que a terapeuta quer trabalhar no momento. Ainda para os surdos mais profundos, pode aplicar-se a tecnologia de tratamento electrónico de sons, traduzindo-os em vibrações, que se percebem pelo tacto.
A nível informático é onde se denotam as principais evoluções para o desenvolvimento da aprendizagem de um surdo. Os computadores estão suficientemente preparados e avançados, de tal forma que estes possuem uma grande capacidade de motivação para os alunos. A comunicação é bidireccional e cada computador pode adaptar-se ao ritmo de trabalho de cada aluno. A correcção dos exercícios é imediata e possui ainda um grande poder de simulação de fenómenos físicos.
O diagnóstico que inicialmente se faz à pessoa deficiente auditiva vai depender muito de alguns factores, tais como: o grau de surdez, o momento em que aparece e em que é detectada a deficiência e até mesmo do próprio indivíduo.
Em alguns casos, o grau de surdez é tão profundo que temos que recorrer a implantes cocleares, com resultados muito prometedores. Os implantes cocleares são aparelhos auditivos com um componente interno introduzido no ouvido interno (através de uma operação) e de um outro, externo, semelhante a uma prótese auricular, ligada a um processador. A colocação desta prótese faz-se através de uma intervenção cirúrgica.
O resultado deste implante é positivo, visto a qualidade do tom de voz melhorar, a fala torna-se mais rítmica, há uma melhor habilidade de produzir fonemas e uma melhor frequência das verbalizações. As pessoas apresentam, ainda, melhor atenção e concentração, mais interesse a falar, fazem menos barulho em casa e conseguem identificar sons ambientais.
Ao contrário do que é pensado por muitas pessoas, nunca se deve falar alto na presença destas pessoas, pois de nada vai adiantar. O docente deverá falar pausada e distintamente, para que o indivíduo compreenda o que está a ser dito. Não nos devemos esquecer que estas pessoas utilizam muitas vezes a leitura labial. Portanto, enquanto está a falar, deverá posicionar-se sempre à sua frente.

O Deficiente auditivo e a Sociedade…
Durante muitos anos, os indivíduos portadores de deficiências eram considerados pela sociedade como sendo aberrações da natureza. Estes eram consequentemente associados à imagem do diabo e a actos de feitiçaria por serem diferentes dos restantes membros da sociedade.
As perseguições, os julgamentos e até mesmo as mortes foram, na Idade Média, a forma “mais eficaz” de resolver estes problemas.
As pessoas com deficiências auditivas não fugiram à regra, sendo vítimas de muitas destas perseguições, uma vez que eram vistas como pessoas diferentes e, portanto, incompreensíveis aos olhos de quem as rodeava.
Porém, a partir do séc. XX, os portadores de deficiências passam a ser vistos como cidadãos com direitos e deveres de participação na sociedade, mas sob uma óptica assistencial e caritativa.
A primeira directriz política dessa nova visão aparece em 1948 com a Declaração Universal dos Direitos Humanos. “Todo ser humano tem direito à educação.”
A partir de então, vários foram os progressos que se fizeram nesse mesmo sentido, até que nos encontramos, actualmente, perante uma mentalidade muito mais aberta, justa, …

Todas as deficiências:
Sendo portador de uma deficiência, posso participar em actividades culturais, desportivas ou recreativas?
Sim, uma vez que são actividades a que todos têm direito e constituem uma necessidade como meio de ocupação qualificada de tempos livres, de aumento dos níveis de integração social e de reabilitação.

Quais os desportos que um deficiente pode praticar?
Qualquer desporto ou modalidade desportiva pode ser praticado(a) por qualquer pessoa portadora de deficiência(s), seja qual for a deficiência.
Poderá escolher qualquer modalidade desde que se sinta com capacidade para a praticar, ainda que com o apoio de uma ajuda técnica ou de um dispositivo de compensação.

Paralisia Cerebral

Definição:

A Paralisia Cerebral é uma doença do foro neurológico que afeta as funções básicas do ser humano (fala, postura, movimento).

Existem vários tipos de Paralisia Cerebral: espástica (em que o movimento é difícil); atetósica (o movimento é descontrolado e involuntário); atáxica (o equilíbrio e a sensibilidade profunda são anormais); mista (uma combinação de vários tipos).

Causas / Sintomas e Sinais:

A Paralisia Cerebral é provocada por uma lesão no cérebro e no sistema nervoso ocorrida antes do nascimento; durante o parto ou depois do nascimento (pouco depois do nascimento).

Os sintomas variam consoante a área de extensão da lesão, podendo incluir: tiques; perturbação da marcha; espasmos; convulsões e fraco tónus muscular.

Para além da motricidade, a Paralisia Cerebral também pode afectar a visão, a audição, a inteligência e a fala.

Diagnóstico:

A necessidade de um diagnóstico precoce prende-se com o facto de dar início à terapia o mais cedo possível.

A Paralisia Cerebral pode manifestar-se logo à nascença ou mais tarde. Em caso de suspeita deve-se consultar um neurologista pediátrico a fim de determinar a extensão e localização da lesão cerebral, de forma a colocar de parte outras doenças.

Tratamento médico:

O tratamento deve envolver uma equipa de profissionais ao nível da saúde: Fisioterapeutas; Terapeutas da Fala e Terapeutas Ocupacionais; um Psicólogo; um Ortopedista e um Neurologista.

A Paralisia Cerebral não tem cura, o objectivo do tratamento médico é ajudar a criança a conseguir uma maior independência possível.

Alguns exemplos:

as convulsões podem ser controladas por medicamentos;

o tratamento ortopédico pode incluir talas, canadianas e aparelhos diversos que possam evitar contracturas e outras deformações dos braços e pernas;

a cirurgia ortopédica pode ser também uma opção cortando músculos e tendões contraídos (permitindo a sua distensão) ou unindo determinados ossos (de modo a estabilizar as articulações).

Este tipo de cirurgias pode permitir à criança um melhor equilíbrio e andar.

Ensino-Aprendizagem:

O Processo Ensino-Aprendizagem deve ser organizado e estruturado de forma a privilegiar o desenvolvimento geral da criança ou jovem com Paralisia Cerebral.

Deve existir uma equipa de profissionais que trabalhem no sentido de suprimir as dificuldades da criança ou jovem.

A criança/jovem com paralisia cerebral deve beneficiar de áreas que possibilitem e auxiliem o seu desenvolvimento, tais como:

– Terapia da Fala – Para elevar a capacidade de expressão oral e de comunicação.

– Terapia Ocupacional – De forma a desenvolver aptidões úteis que lhes permitam desempenhar tarefas de rotina.

– Psicomotricidade – Para melhorar a adaptação ao mundo exterior, através do domínio do equilíbrio; controle da inibição voluntária e da responsabilidade; consciência do corpo; eficácia das diversas coordenações globais e segmentárias; organização do esquema corporal; orientação espacial; etc.

– Apoio Psicológico – Para acompanhar a criança/jovem durante o Processo Ensino-Aprendizagem ao nível psicológico.

– Fisioterapia – Através da utilização do exercício e técnicas de relaxamento; para ensinar a caminhar com o auxílio de canadianas muletas e outros aparelhos (como cadeira de rodas); para auxiliar a rotina diária da criança ou jovem.

– Áreas de Expressão – A Dança e Música podem auxiliar as crianças ou jovens a elevarem a sua coordenação, desenvolverem o tónus e força muscular, autoconfiança, etc. As actividades de Expressão Plástica, como a Pintura podem ajudar no desenvolvimento da motricidade, comunicação, etc.

– Actividades Aquáticas – O contacto com a água ou realização de exercícios dentro de água auxiliam um melhor funcionamento do sistema circulatório, respiratório, fortalecimento dos músculos, aumento do equilíbrio, relaxamento muscular, diminuição de espasmos, aumento da amplitude de movimentos, etc.

– Massagens – Aliviam espasmos e reduzem contracções musculares.

– Informática – A utilização do computador pode ajudar ao nível da comunicação, assim como ao nível da motricidade fina.

– Atividades da Vida Diária – Para trabalhar a higiene, segurança, entre outros.

A criança ou jovem com Paralisia Cerebral pode estar integrada no Ensino Regular ou Especial. Contudo, a criança/jovem deve beneficiar numa primeira instância de uma Estimulação Global e só posteriormente de uma Iniciação Académica.

O trabalho realizado pelos técnicos (Professor, Educadora, Psicóloga, Terapeutas, etc.), assim como a integração de todas as áreas acima mencionadas deverão procurar elevar o nível Cognitivo; Autonomia Pessoal e Social; Comunicação; Psicomotor; Sócio-Afectivo; assim como desenvolver a área Sensorial-Perceptiva.

Encarregados de Educação:

Os Encarregados de Educação podem proporcionar um ambiente que estimule a aprendizagem e a exploração.

Ajudando no exercício físico regular; no desenvolvimento de hábitos de higiene; utilização de materiais e utensílios que auxiliem a criança/jovem com Paralisia Cerebral (tais como: talheres especiais, auxiliares para vestuário, escovas de dentes próprias, entre outros).

A Paralisia Cerebral é uma doença que dura toda a vida e geralmente requer uma adaptação e uma formação no sentido de atingir a auto-suficiência.

É necessário que exista um trabalho conjunto entre Técnicos e Encarregados de Educação, proporcionando uma diversidade de áreas, no sentido de desenvolver e elevar as capacidades gerais da criança/jovem com Paralisia Cerebral, assim como a sua qualidade de vida.

Edição: Gilson de Souza DANIEL
Fonte: Prof. Pedro Santos/Internet

Pessoas com Deficiência psicossocial/transtornos mentais

CLEOdomira Soares dos Santos (Cascavel – Pr – Brazil)

Inclusão Profissional da Pessoa com Deficiência Psicossocial

A inclusão profissional de pessoas com deficiência é um tema amplamente discutido nos últimos anos no Brasil e quase sempre, está relacionado à contratação por meio de cotas, atendendo aos dispositivos da Lei 8.213/91 artigo 93 que estabelece que:

“A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência”.

O surgimento dessa obrigatoriedade imposta às empresas é resultado de um amplo processo de defesa de direitos e um passo importante para cidadania e inclusão profissional da pessoa com deficiência.

Na História da Humanidade, a pessoa com deficiência foi por muito tempo considerado incapaz e assim, discriminado, excluído de participação social e subtraído de seus direitos civis.

Se na Antiguidade e Idade Média, eram até mesmo mortas por serem consideradas defeituosas, aberrações e até endemoniadas, no início do século XVIII, a Igreja Católica passou a considerá-las objeto de caridade, assistencialismo e portanto, dependentes de terceiros e incapazes de decidirem sobre os rumos de sua própria vida.

No Brasil do século XX, entidades de atendimento e representação de direitos de pessoas com deficiência, como as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAEs), começaram a surgir e iniciaram importantes atividades de inclusão social, reforçando a necessidade de se oferecer serviços especializados que contribuíssem ao desenvolvimento integral de pessoas com deficiência.

A trajetória da inclusão de pessoas com deficiência é, portanto, uma trajetória marcada por lutas, vivida na História da Humanidade com muitas dores e injustiças e arraigada de uma cultura assistencialista que descredita à pessoa com deficiência, sua capacidade de autonomia e dignidade.

Falar sobre acessibilidade da pessoa com deficiência no trabalho é antes de tudo, falar da concretização de direitos fundamentais, do exercício da cidadania e da responsabilidade de toda sociedade em fazer valer o que em lei se conquistou tão recentemente.

Por outro lado, quando propomos a discussão sobre inclusão de um segmento tal na sociedade, evidenciamos uma realidade excludente, que historicamente segregou e fez do meio que em que vivemos um ambiente cheio de barreiras, por vezes, inacessível a algumas pessoas.

Por estarmos em uma sociedade marcada por desigualdades, temos a necessidade de estabelecer leis e normas que assegurem direitos para todos, e em todos os espaços.

Foi exatamente assim, que progressivamente as legislações sobre a inclusão de pessoas com deficiência no trabalho evoluíram.

Desde a promulgação da lei de cotas em 1991, o estado brasileiro vem cobrando das empresas de médio e grande porte, a entrada de jovens e pessoas com deficiência no mercado de trabalho formal, seguindo normativas pactuadas por organizações internacionais, como comentado a seguir:

Lei de Cotas 8.213/91: contratação por reserva de vagas para pessoas com deficiência por empresas com mais de cem funcionários. Pela primeira vez, é regulamentada a entrada de pessoas com deficiência no mercado de trabalho no Brasil.

Lei do Aprendiz 10.097/00: contratação por programa de aprendizagem profissional para jovens de 14 à 24 anos. Para pessoas com deficiência, a lei estabelece mínimo de dezoitos anos para contratação, e não estabelece limite de idade. Estabelece ainda que a comprovação de escolaridade de pessoa com deficiência mental considerará as habilidades e competências relacionadas à profissionalização.

Lançado pela Organização Internacional do Trabalho, o pacto pelo Trabalho Decente em 2003: em 2007 o Brasil, lançou a Agenda para o Trabalho Decente e em 2010 o Plano Nacional de Emprego e Trabalho Decente para geração de mais e melhores empregos, igualdades de oportunidades e tratamento, erradicação do trabalho escravo e infantil.

Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU, 2008): ampliação do conceito de deficiência, entendida como impedimentos de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.

Em 2009, através do Decreto Federal 6.949 o Brasil promulgou a Convenção, se comprometendo a cumprir e executar seus dispositivos integralmente em território nacional.
Decreto 7.612 em 2011: institui o plano nacional dos direitos da pessoa com deficiência, tendo em suas diretrizes a ampliação da participação das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, mediante sua capacitação e qualificação profissional.

Lei Brasileira de Inclusão (13.146/15): consolida a Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência para uma sociedade inclusiva e reforçando a concepção de que a deficiência depende do meio em que a pessoa está inserida.

O entendimento que a deficiência não está na pessoa, mas antes, no ambiente é um marco na luta e mudança de paradigmas. Assim, a deficiência não é uma condição patológica, exclusiva da pessoa, mas antes, é uma condição socioambiental.

A complexidade das barreiras que permitem o acesso dessa pessoa a direitos como trabalho, educação, saúde e moradia, é que caracterizam a presença de uma deficiência, como estabeleceu a Convenção Internacional para os Direitos da Pessoa com Deficiência pela ONU no ano de 2008, e como destacou a Lei Brasileira de Inclusão (13.146/15):

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

1º A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:

I – os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;

II – os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;

III – a limitação no desempenho de atividades; e

IV – a restrição de participação.

Com o avanço das políticas e leis destinadas pessoas com deficiência, hoje a classificação de deficiência considera portanto, fatores multidimensionais da funcionalidade humana. A compreensão da relação que a pessoa tem com o ambiente, passa a ser determinante para classificação de deficiência e indispensável para abordagem dos profissionais que trabalham com inclusão, para garantir a acessibilidade adequada.

Paralelamente, a partir do ano 1978 no Brasil, diversos movimentos sociais iniciaram reivindicações de direitos a pacientes psiquiátricos. Alinhado a movimentos em diversos países, essas reivindicações buscavam a reestruturação da assistência psiquiátrica com a reversão do modelo hospitalocêntrico.

Em 2001, o Brasil promulgou a lei 10.216 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais.

Também conhecida como a lei da Reforma Psiquiátrica, essa lei é um marco na saúde mental pela luta antimanicomial que acompanhou movimentos similares de vários outros países, em favor da dignidade de tratamento, contra internações psiquiátricas, cobrando da sociedade a convivência familiar e comunitária das pessoas com transtornos mentais e oportunidades para uma vida pautada em dignidade, respeito e direitos sociais.

Essa lei foi responsável pelo fechamento de diversos hospitais psiquiátricos (ou manicômios) que por muitos anos, foram locais de tortura, abandono e violência institucionalizada.

Com o intenso debate em torno de qual modelo de atenção seria adotado pela política nacional de saúde mental, foi proposto um modelo de rede com base territorial e comunitária, com progressiva redução de leitos em hospitais psiquiátricos, normatização e fiscalização das internações psiquiátricas, reversão dos gastos em saúde mental e garantia de direitos de cidadania para as pessoas com transtornos mentais.

Como proposto pela Reforma Psiquiátrica no Brasil, o tratamento das pessoas com transtornos mentais passou a ser feito em serviços de saúde próximos de sua residência: “O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio.” (Lei 10.216/01 Artigo 4º, § 1o)

Diversos equipamentos passaram então a integrar a política de saúde mental, como por exemplo, a criação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) no ano de 1986 (Caps Itapeva).

Com objetivo de oferecer tratamento especializado e multiprofissional para pessoas com transtornos mentais em local próximo de sua residência, os CAPS passaram a ser a porta de entrada para reabilitação e suporte psicossocial, através de atendimento clínico e reinserção social pelo acesso ao trabalho, lazer, cidadania e fortalecimento de vínculos.

Da mesma forma que a acessibilidade ao trabalho para pessoas com deficiência é marcada por uma história de exclusão, a inclusão social de pessoas com transtornos mentais é de igual forma, ou ainda pior, uma trajetória evidenciada pela marginalização de direitos civis.

As pessoas com transtornos mentais estiveram historicamente à margem da sociedade. Antes da Reforma Psiquiátrica, eram depositadas em manicômios ou afastadas do convívio social e compulsoriamente interditadas de seus direitos civis, por serem consideradas alienadas.

Com a evolução do conceito de deficiência, a partir da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, foi possível requerer o direito de acessibilidade no trabalho também às pessoas com transtornos mentais, uma vez que identificado os impedimentos destas em relação a interação com o ambiente.

Considerando os impedimentos de natureza mental, que implicam em limitações na função do corpo – neste caso para transtornos mentais, e, portanto de funções mentais – os transtornos psiquiátricos podem acarretar limitações e prejuízos significativos que implicam em permanentes déficits intelectuais e de cognição que ainda que sejam tratados clinicamente, dependem do que o ambiente oferece para terem plena participação social e igualdade de oportunidades, como o acesso de medicação e intervenções multiprofissionais por período de tempo indeterminado.

Tais aspectos da funcionalidade da mente humana, são facilmente identificados no acompanhamento terapêutico de pessoas com transtornos mentais, seja por exame psíquico ou por avaliações biopsicossociais.

Como proposto pela Lei Brasileira de Inclusão, a avaliação de deficiência pode ser biopsicossocial para melhor identificação dos impedimentos e barreiras que interagem com indivíduo para considera-lo com deficiência:

Art. 2o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

1o A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:

I – os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;

II – os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;

III – a limitação no desempenho de atividades; e

IV – a restrição de participação.

A quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V) lançado em 2013, é uma referência na prática clínica para diagnóstico e tratamento dos transtornos mentais. Busca padronizar universalmente a linguagem sobre as características de cada transtorno, para comunicação precisa de estatísticas de saúde pública em conformidade com a Classificação Internacional de Doenças (CID).

Ao descrever os aspectos que definem cada transtorno, o DSM-V traz informações precisas sobre o impacto nas funções mentais que comprometem a funcionalidade do indivíduo e que em casos graves ou crônicos, o prejudicam por toda vida.

Como um exemplo de transtorno mental grave, podemos citar os transtornos psicóticos e esquizofrenia. Esses transtornos são definidos por anormalidades em um ou mais dos cinco domínios a seguir: delírios, alucinações, pensamento (discurso) desorganizado, comportamento motor grosseiramente desorganizado ou anormal (incluindo catatonia) e sintomas negativos (DSM-V, p. 131).

Na mesma época de publicação da Lei 10.216 que reformulou a assistência psiquiátrica no Brasil, o mundo inteiro também discutia na ONU a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF. Com sua primeira publicação em 2001 pela Resolução 5421 da Organização Mundial de Saúde, a CIF veio para complementar a Classificação Internacional de Doenças (CID) e padronizar uma linguagem universal que melhor descrevesse e avaliasse a funcionalidade humana considerando aspectos multidimensionais e por isso, é considerada um marco no debate sobre deficiência.

Alinhado aos demais países membros da ONU, o Brasil acompanhou as definições e reconhecimentos internacionais dos direitos das pessoas com deficiência, conforme Decreto Federal 6.949/09, ratificando a Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que já reproduzia inclusive, o entendimento da CIF sobre deficiência a ser considerada como problemas nas funções ou estruturas do corpo, tais como, um desvio importante, perda ou limitações.

Desta forma, a funcionalidade humana diz respeito aos aspectos positivos de participação e atividades em que o indivíduo interage em seu contexto sócio ambiental e, a incapacidade e deficiência, decorre das limitações e são portanto, os aspectos negativos que restringem a participação do indivíduo em seu contexto sócio ambiental.

O Brasil acompanhou a mudança de paradigmas sobre a deficiência, ao mesmo passo que importantes mudanças na política nacional de saúde mental estabeleciam objetivos claros para promoção e suporte para inclusão e reabilitação profissional de pessoas com transtornos mentais, sendo essa questão inclusive reforçada nos objetivos da Rede de Atenção Psicossocial, criada em 2011 pelo Ministério da Saúde pela Portaria 3.088:

Artigo 4º, IV – Promover a reabilitação e a reinserção das pessoas com transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas na sociedade, por meio do acesso ao trabalho, renda e moradia solidária.

As primeiras iniciativas no campo da saúde mental de impacto para geração de renda e trabalho para pessoas foram experimentadas no formato de cooperativismo e autogestão de interesse dos trabalhadores conhecido como Economia Solidária e regida por valores como:

posse e/ou controle coletivo dos meios de produção, distribuição, comercialização e crédito;
gestão democrática, transparente e participativa dos empreendimentos econômicos e/ou sociais;
distribuição igualitária dos resultados (sobras ou perdas) econômicos dos empreendimentos.

A inclusão no trabalho para pessoas com transtornos mentais caminhou a passos lentos e desconfiados desde a Reforma Psiquiátrica e ainda hoje, é marcada por estigmas, desinformação e exclusão.

Por outro lado, há que se considerar também a contraditoriedade em se promover a inclusão no trabalho para pessoas em sofrimento psíquico. Isso porque, o trabalho é considerado também um dos principais motivos de adoecimento mental.

Mas ainda que seja um risco ao adoecimento, o trabalho é também permeado por subjetividades que compreendem a definição de papel social dando significado a existência humana e compondo de forma relevante a consciência de felicidade a partir da satisfação com realização pessoal, profissional e bem-estar que o indivíduo faz sobre si, como bem apresentado no Índice de Bem-Estar Brasil, premiado pela ONU e publicado em Janeiro de 2014.

Entre debates e estudos sobre o assunto que vão desde a discussão sobre terminologia mais adequada, aspectos ideológicos, clínicos e psicossociais há o fato de que apesar dos esforços legais para inclusão profissional de pessoas com deficiência, os índices mostram que há ainda um longo caminho a se percorrer, uma vez que a deficiência mental é ainda o segundo tipo de deficiência com menor número de pessoas empregadas no Brasil.

Apesar dos avanços, se não fosse a lei de cotas, talvez não tivéssemos nem os quase 1% de trabalhadores com deficiência empregados com carteira assinadas atualmente no Brasil.

Em 2017, apenas 0,95% do total de empregados no Brasil foram pessoas com deficiência. No que tange a distribuição entre os tipos de deficiência, 48% dos empregados foram pessoas com deficiência física; 19% com deficiência auditiva, 14% com deficiência visual; 8% com deficiência intelectual e 2% com deficiência múltipla, demonstrando portanto, uma inclusão não igualitária (RAIS/Ministério do Trabalho, 2017).

Como se pode perceber, há ainda a gravíssima situação da inexistência de dados estatísticos sobre a contratação de pessoas com deficiência mental e psicossocial no Brasil. As bases de dados estatísticos da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), não permitem alimentar o sistema com informações sobre o tipo de deficiência psicossocial, tornando impreciso e confuso os dados existentes.

Ainda que cerca de 24% da população brasileira possua algum tipo de deficiência (Censo IBGE, 2010) os dados atuais sobre a distribuição por tipo de deficiência, supõe que a deficiência mental e psicossocial estejam contabilizadas no tipo intelectual.

Mas o que são as deficiências psicossociais? O que as difere da deficiência mental?

A partir da Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual, aprovada em 6/10/04 pela Organização Mundial da Saúde (OMS, 2004), em conjunto com a Organização Panamericana de Saúde (Opas), o termo “deficiência mental” passou a ser considerada apenas como “deficiência intelectual”.

Segundo Romeu Sassaki, as deficiências psicossociais são as sequelas de transtornos mentais. Diferente de transtorno mental, as deficiências psicossociais são quando quadros psiquiátricos já estabilizados, acarretam limitações e prejuízos das funções mentais do indivíduo de forma permanente. Assim, nem todo transtorno mental é uma deficiência psicossocial. Mas sim, aquele em se identificam sequelas permanentes. Os transtornos bipolares, transtornos psicóticos e a esquizofrenia são os mais comuns na trajetória de inclusão no mercado de trabalho por lei de cotas para pessoas com deficiência, sendo inclusive já apontados pelo Ministério do Trabalho em Instrução Normativa 98/2012.

Contudo, não há como se estabelecer rigorosamente que toda pessoa com esquizofrenia ou bipolaridade sejam consideradas pessoas com deficiência psicossocial. O que vai definir a existência de uma deficiência por transtorno mental, são os impedimentos de natureza mental que na interação do indivíduo com o ambiente produzem barreira para o acesso ao direito em igualdade de participação com as demais pessoas, e para isso, é previsto pela LBI a avaliação biopsicossocial.

A gravidade de um transtorno mental está principalmente associada ao tempo de início de um tratamento adequado. Quanto mais tempo a pessoa leva para iniciar um tratamento, maiores são os riscos de esse transtorno impactar negativamente na funcionalidade da pessoa.

Seja qual for o transtorno mental existente, na ocorrência de um impacto negativo significativo e de longo prazo nas funções mentais, pode então ser considerada deficiência psicossocial.

Conforme Manual Diagnóstico e Estatísticos dos Transtornos Mentais (DSM-V), são descritos os seguintes transtornos mentais existentes:

– Transtornos do Neurodesenvolvimento: como a deficiência intelectual e atraso global do desenvolvimento.

– Transtornos da Comunicação: como linguagem, fala, gagueira.

– Transtornos do Espectro Autista.

– Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade.

– Transtornos específicos da aprendizagem: como a dislexia e discalculia.

– Transtornos motores: como coordenação, estereotipia, tiques e Tourette.

– Espectro da esquizofrenia e transtornos psicóticos.

– Transtorno Bipolar.

– Transtornos Depressivos.

– Transtornos de Ansiedade.

– Transtornos Obsessivo-compulsivo.

– Transtornos Relacionados a Traumas e Estressores.

– Transtornos Dissociativos.

– Transtornos de Sintomas Somáticos.

– Transtornos Alimentares.

– Transtornos da Eliminação: como enurese diurna ou noturna.

– Transtornos do Sono Vigília: como insônia, hipersonolência e apnéia.

– Disfunções Sexuais.

– Disforia de gênero.

– Transtornos Disruptivos, do Controle de Impulsos e Conduta: como antissocial, cleptomania, oposição desafiante.

– Transtornos Relacionados a Substâncias e Aditivos: como álcool, cafeína, cannabis, alucinógenos e inalantes.

– Transtornos neurocognitivos: como delirium, Alzheimer, lesão cerebral traumática, acidente vascular, infecção por HIV, Parkinson.

– Transtornos da personalidade: como borderline, histriônica, narcisista.

– Transtornos Parafílicos: como exibicionista, masoquismo e sadismo sexual, pedofílico e fetichista.

Todos os transtornos acima descrito, podem ser classificados como deficiência psicossocial a depender de avaliação biopsicossocial que concluirá se as dificuldades e limitações da pessoa correspondem a aspectos transitórios ou permanentes e o grau de impacto na funcionalidade da pessoa.

Alguns transtornos mentais podem ser transitórios e remitidos sem necessidade de prolongada intervenção clínica e multiprofissional. Já outros transtornos considerados graves e persistentes – como os casos de esquizofrenia e transtorno bipolar, ainda que estabilizados produzem prejuízos na funcionalidade humana. Daremos aqui um foco maior para esquizofrenia, que será também relacionada em um estudo de caso para essa aula.

A esquizofrenia é apontada pela Organização Mundial de Saúde como uma das principais causas de incapacidade no mundo. Sua causa ainda não é clara no campo científico, mas aponta fatores de riscos genéticos, ambientais e biológicos.

A esquizofrenia atinge cerca de 1% da população mundial e seus sintomas são caracterizados em:

– Positivos: delírios, alucinações, persecutoriedade, desorganização do pensamento, catatonia, comportamento bizarro, heteroagressividade, alterações do teste de realidade, com surgimento na adolescência ou início da fase adulta.

– Negativos: embotamento afetivo, isolamento social, ambivalência, baixa volição, empobrecimento das experiências emocionais, alogia, disfunção da socialização e anedonia.

O tratamento da esquizofrenia envolve abordagem clínica por psiquiatra e multiprofissional, como realizado por Terapia Ocupacional e Psicoterapia. A abordagem clínica é feita com a manutenção e acompanhamento de medicação antipsicótica que com boa resposta, pode reduzir e até em alguns casos, remitir os sintomas positivos descritos. Mas os sintomas negativos não se tratam com medicações, por isso é fundamental a abordagem multiprofissional com terapias individuais e em grupo que possam apoiar a pessoa com esquizofrenia em se conhecer, relacionar-se e inserir-se no mundo.

A deficiência psicossocial é também chamada “deficiência psiquiátrica” ou “deficiência por saúde mental”. A inserção do tema “deficiência psicossocial” no texto da Convenção representa uma histórica vitória da luta de pessoas com transtornos mentais, familiares, amigos, usuários, trabalhadores, provedores de serviços de reabilitação física ou profissional, pesquisadores, ativistas do movimento de vida independente e demais pessoas em várias partes do mundo. Desta forma, pela primeira vez na história dos direitos humanos, pessoas do campo da saúde mental e pessoas do campo das deficiências trabalharam juntas em torno do mesmo objetivo ― a elaboração da Convenção (SASSAKI, 2010a).

Entre alguns dos impactos socioambientais de um transtorno mental, podemos destacar:

– No indivíduo: aumento do custo de vida para utilização de serviços de saúde e medicação, dificuldade de acesso e manutenção do trabalho, diminuição da qualidade de vida, redução de produtividade, mortalidade prematura, tempo de trabalho perdido.

– Na família: conflitos, sobrecarga de cuidados, pessimismo, dificuldades de relacionamento.

Os transtornos mentais graves podem impactar na funcionalidade psíquica e social gerando dificuldades e limitações tais como: dificuldade de manter as atividades de vida diária, prejuízos funcionais e cognitivos, dificuldade de manter relacionamentos sociais, dificuldade de acesso ao mercado de trabalho. Essas dificuldades são condicionantes das formas de organização da sociedade e produzem efeitos de discriminação e exclusão reprodutores de isolamento e estigma. Se mesmo após tratamento e reabilitação a pessoa permanece com limitações funcionais, a partir dos parâmetros da Classificação Internacional de Funcionalidade, pode estar caracterizada uma deficiência psicossocial (SILVA, LIMA, RAINONE 2016, p. 3).

Em São Paulo, o Programa Inserir realizado pelo ambulatório de esquizofrenia da Escola Paulista de Medicina-Unifesp, tem experimentado desde 2015 a efetiva contratação de seus pacientes em vagas de trabalho pela lei de cotas em grandes empresas. Tornando-se um importante referencial de modelo de empregabilidade para pessoas com esquizofrenia, o Programa Inserir tem buscado representar o direito de acesso ao trabalho para estas pessoas reconhecendo-as como pessoas com deficiência psicossocial. Para isso, além de diversas parcerias com órgãos públicos e privados, elaborou em 2018 um Guia para Gestores, lançado em 2019, que reúne dicas e orientações importantes para promoção da inclusão profissional pela lei de cotas para pessoas com deficiência biopsicossocial por esquizofrenia, em parceria com o Ministério do Trabalho.

Em contato com a tecnologia do Emprego Apoiado e a partir da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU-2008), o Programa INSERIR voltou seus esforços desde 2014 a promover efetivamente a inclusão profissional de pessoas com esquizofrenia pela Lei de Cotas. Como estratégia de política social de acesso ao trabalho, a inclusão profissional de pessoas com esquizofrenia no mercado formal trouxe de forma pioneira a efetiva experiência de gerar sustentabilidade financeira, autonomia e contribuir para superação das barreiras sociais e atitudinais impostas pelo transtorno. (Guia Prático para Gestores, O que você pode fazer para incluir pessoas com esquizofrenia no mercado de trabalho pela lei de cotas? – S. Paulo, 2018)

Em nota técnica 01/2017 a Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência e com Altas Habilidades no Rio Grande do Sul (FADERS) buscou fornecer subsídios para ampliação das perspectivas de acesso das pessoas com deficiência psicossocial nas políticas públicas evidenciando que “Pela primeira vez na história dos direitos humanos, pessoas do campo da saúde mental e pessoas do campo das deficiências trabalharam em torno do mesmo objetivo ― a elaboração da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, reconhecendo que a sequela de um transtorno mental constitui uma categoria de deficiência, estas a colocaram como deficiência psicossocial junto às 3 tradicionais deficiências (física, intelectual, auditiva e visual).

Acessibilidade no Trabalho para pessoas com Deficiência Psicossocial por Esquizofrenia

Pessoas com deficiência psicossocial têm encontrado oportunidades de empregabilidade em vagas pela lei de cotas. Exemplo disso é o Programa Inserir, do Proesq (Programa de Esquizofrenia – Escola Paulista de Medicina), que desde 2015, têm efetivado contratações e acompanhado a inclusão de pessoas com esquizofrenia em vagas no mercado formal pela lei de cotas para pessoas com deficiência em parceria com órgãos governamentais como Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho, Secretaria Municipal e Estadual de Pessoas com Deficiência e diversas outras instituições pública e privada.

Atualmente, o Inserir contabiliza 38 contratações de pessoas com esquizofrenia em vagas de trabalho pela lei de cotas para pessoas com deficiência, sendo estas contratações informadas pela empresas aos órgãos de fiscalização e controle com a inclusão por deficiência mental.

O funcionamento do Inserir é dentro do ambulatório do Proesq (Unifesp), para pacientes em tratamento há mais de seis meses. Após triagem e avaliações multiprofissionais, os pacientes são inscritos em grupos terapêuticos e grupos de orientações práticas. Com o resultado das avaliações e levantamento de perfil psicológico e profissional, os pacientes são encaminhados para vagas e o Inserir passa a acompanhar os processos seletivos. Com a contratação, a empresa recebe visitas de representantes do Inserir, para orientações sobre a acessibilidade e o contratado é mantido em acompanhamento terapêutico de grupo ou individual por até 12 meses.

Oferecendo amplo mapeamento de habilidades e limitações da pessoa com esquizofrenia através de avaliações biopsicossociais e suporte terapêutico, o Programa Inserir tem utilizado a lei de cotas como estratégia de inclusão sustentável que de acordo com o perfil profissional e psicológico da pessoa, oferece às empresas contratantes informações específicas para melhor integração e produtividade da pessoa com deficiência no ambiente laboral.

A base dessa metodologia é fundamentada no emprego apoiado e no suporte psicossocial por gerenciamento de caso alinhado ao plano singular terapêutico de cada pessoa.

Acredita-se que a lei de cotas e o mercado formal não deve ser a única possibilidade de inclusão profissional. Deve-se respeitar as preferências e habilidades de qualquer pessoa, independente de ter ou não deficiência. Mas como modelo referencial em curso, foi escolhido concentrar os esforços nesse modo de oferta de vagas pela lei de cotas.

A experiência do Programa Inserir, destaca a necessidade de se avançar nas discussões sobre a empregabilidade da pessoa com deficiência psicossocial por esquizofrenia, adotando todas as formas disponíveis de inclusão profissional e de acordo com as capacidades de cada um, transformando assim, estatísticas mais positivas sobre a presença dessa parcela da população no mercado de trabalho no Brasil.

Raramente se encontram empresas que voluntariamente estejam interessadas em contratar pessoas com deficiência (de qualquer tipo). Se não fosse a obrigatoriedade da contratação por força da lei de cotas, questiona-se se teríamos hoje, um panorama diferente de um século atrás, quando pessoas com deficiência eram compulsoriamente consideradas incapazes ou ainda, inválida.

Com base nas experiências do trabalho realizado pelo Programa Inserir ao longo dos últimos anos, foi possível levantar dados sobre as necessidades de apoio e acessibilidade para pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia para efetiva inclusão no mercado de trabalho formal (dentro ou fora da lei de cotas) com maior assertividade, são estes:

Necessidades de apoio e acessibilidade:

Ininterrupção de suporte clínico e terapêutico:

A empresa deve facilitar o acesso da pessoa em suas consultas regulares com psiquiatra e atendimentos por equipe multiprofissional, para assegurar a continuidade de estabilidade psíquica.

Comunicação clara das atribuições e rotinas profissionais:

Sempre que possível e independente de iniciativa do colaborador no questionamento de dúvidas, deve-se propiciar o diálogo constante para certificação de que a demanda de trabalho esteja sendo compreendida corretamente e evitar assim, interpretações equivocadas ou fora do estabelecido nas responsabilidades. Essa questão é de extrema importância porque geralmente, as pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia são altamente comprometidas e tem grande tendência a serem concretas, rígidas, metódicas e detalhistas, fazendo que cobrem de si demasiadamente e aumentando os riscos de tensão e stress no trabalho.

Carga Horária reduzida:

Recomenda-se a carga horária de trabalho inferior a seis horas diárias e ao menos dois dias de descanso semanal. Pessoas com esquizofrenia fazem uso de medicações (antipsicóticos) que comumente provocam sonolência e com isso, tem uma tolerância menor a sobrecarga de horas de dedicadas ao trabalho que vão desde o tempo gasto no trajeto, como o tempo presencial no ambiente laboral. Sugere-se a carga horária de 30 horas semanais.

Suporte por emprego apoiado:

O emprego apoiado é uma tecnologia assistiva reconhecida pela Lei Brasileira de Inclusão. No aspecto de inclusão profissional, consiste em propiciar apoio técnico profissional, também chamado de agente facilitador e de apoio no ambiente de trabalho (Artigo 37, II, LBI), que facilite a aprendizagem, autonomia, qualidade de vida, inclusão social e intermedie as situações vividas pela pessoa com esquizofrenia, até que este tenha plena independência na realização de suas atribuições.

Conhecimento e informação da empresa sobre as habilidades e dificuldades comuns da pessoa com esquizofrenia:

O estigma e discriminação são as principais barreiras para o acesso da pessoa com deficiência psicossocial no trabalho. O medo e insegurança das empresas na contratação é o que produzem as barreiras atitudinais, ou seja, a relação da postura e atitude de terceiros sobre a pessoa com deficiência. A melhor forma de enfrentamento dessa questão é através da informação. Promover um espaço de escuta e conhecimento sobre esse tipo de deficiência facilitará para que cada vez mais as pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia sejam respeitadas e valorizadas para além de suas limitações.

Conforme Guia Prático para Gestores para inclusão profissional de pessoas com deficiência psicossocial, lançado em 2019 em parceria com o Ministério Público do Trabalho de São Paulo, foi realizado um levantamento dos dados coletados das avaliações psicossociais com os participantes do Programa Inserir que revelaram um perfil comum em pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia, como descrito no quadro a seguir:

Habilidades comuns

Limitações comuns

Forte senso de responsabilidade;

Rigor com horário e normas institucionais;

Comprometimento com atividades e no cumprimento de tarefas direcionadas;

Bom desenvolvimento acadêmico, intelectual e autonomia;

Senso moral, valores sociais e reciprocidade nas relações formais;

São gentis, prezam pelo respeito ao próximo e são solidários;

Perfil profissional conservador, sistemático, analítico, concreto e introvertido;

São detalhistas e possuem facilidade para trabalhar em atividades que necessitam de paciência e de atenção aos pormenores.

Bom desenvolvimento para atividades profissionais concretas e bem definidas.

Diminuição da capacidade de expressar emoções (embotamento afetivo).

Redução na volição ou iniciativa;

Redução do sentimento de prazer;

Dificuldade em tomar decisões;

Dificuldade em prestar atenção, manter concentração e dificuldades de memória;

Baixa tolerância ao stress.

Dificuldades de comunicação: oral, escrita.

A acessibilidade da empresa contratante deve ser pautada em uma cultura de diversidade, inclusão, respeito, empatia e com valores institucionais refletidos em todas as práticas gerenciais para toda e qualquer pessoa com ou sem deficiência.

Estudo de caso

Conheceremos agora um caso real de inclusão profissional de pessoa com deficiência psicossocial por esquizofrenia que há quatro anos está empregado pela lei de cotas.

Henrique tem 32 anos, Ensino Médio completo e reside na zona leste de São Paulo com os pais.

Identificação

Nome completo: HENRIQUE VERISSIMO RIBEIRO

32 anos

Sem filhos, Solteiro

Ensino Médio Completo

Renda familiar aproximada de até 3 salários mínimos

Reside com pai e mãe em São Paulo, Zona Leste

Pai aposentado – 75 anos

Mãe do lar – 66 anos

Tipo de deficiência: MENTAL/PSICOSSOCIAL

Causa da Deficiência: Adquirida

CID-10 F20 Esquizofrenia

Local de Tratamento

PROESQ – Programa de Esquizofrenia da Escola Paulista de Medicina (Unifesp) – gratuito

Impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo

Limitações de funções mentais e psicossociais globais.

Limitações de interação interpessoal

Fatores socioambientais

Alto grau de dependência socioambiental:

Dependente de medicação de alto custo para estabilidade psíquica: Olanzapina e Invega Sustena.

Fragilidade de acesso a recursos de saúde mental próximo de sua residência.

Beneficiário de bilhete de isenção tarifária para transporte público.

Observações: Grau de dependência atribuído é principalmente a necessidade contínua de utilização de medicação com distribuição pelo SUS através de Farmácia de Alto Custo (Olanzapina) e para a medicação Invega Sustena, que é integralmente fornecida pelo PROESQ – uma vez que a mesma não é fornecida no SUS – e a família não tem condições financeiras para pagar (aproximadamente R$ 2mil por dose). Devido vulnerabilidades do sistema de saúde, com frequência, a medicação fornecida pelo SUS fica em falta, colocando-o em risco de recaída.

Limitação no desempenho de atividades

Dificuldades em estabelecer relações interpessoais complexas.

Restrição de participação

Restrição de participação em atividades laborais com sobrecarga de horas de trabalho por dia.

Experiência Profissional anterior

Trabalhou com Auxiliar Técnico em empresa multinacional. Ficou por muito tempo afastado do trabalho após início do transtorno mental e encontrou muita dificuldade. Tinha dificuldades em dar continuidade em atividades que iniciava.

Primeira Experiência na Lei de cotas

Contratado como Jovem Aprendiz com deficiência por uma grande empresa do ramo de transportes em Agosto de 2015, desempenhou a função de Assistente Administrativo, trabalhando quatro horas por dia de segunda à sexta feira, até 2018. Durante o período, realizou curso profissionalizante em importante instituição de ensino vinculada a empresa contratante. Foi reconhecido como um dos melhores alunos de sua turma, sendo inclusive, premiado entre formandos pelo seu bom desempenho, assiduidade e comprometimento.

Segunda Experiência na Lei de Cotas

Em Dezembro de 2018, obteve nova contratação como Jovem Aprendiz com deficiência em grande empresa do ramo de alimentos, trabalhando na função de Promotor de Vendas com contrato de oito meses de trabalho. Tem bom desenvolvimento no trabalho.

Habilidades funcionais

Independência completa para uso do dinheiro, pagar e comprar, realizar transações bancárias, poupar e planejar suas finanças.

Independência completa para utilização de transporte público.

Maiores dificuldades percebidas por Henrique no trabalho

Trajeto de transporte público: aglomeração e demora.

Mudanças que o trabalho proporcionou

Melhor qualidade de vida.

Estruturação de sua rotina com horários e disciplina para dormir e acordar.

Considerações Finais

A acessibilidade no trabalho para pessoas com deficiência é um direito garantido e reconhecido mundialmente, independente da exigência de cumprimento por lei de cotas. Configura um novo paradigma de sociedade pautada na inclusão e respeito pelas diferenças, garantindo a todos plena participação social e cidadania.

O crescente aumento dos transtornos mentais em todo o mundo, torna urgente a ampliação do debate e do suporte de políticas públicas que propiciem de forma intersetorial a inclusão social e profissional das pessoas com deficiência psicossocial.

Ao tratarmos sobre a deficiência psicossocial, fica claro que há ainda um longo caminho a se percorrer. Por ser ainda um conceito muito recente, é por muitos desconhecido e carrega marcas de uma trajetória de lutas que ainda não se desvinculou integralmente dos estigmas atribuídos aos transtornos mentais.

Para além do debate ideológico, há a urgência em tratar a saúde mental como um problema de questão social que impacta diretamente no desenvolvimento econômico de toda sociedade.

Oferecer oportunidades de inclusão profissional para pessoas com deficiência psicossocial por transtornos graves e persistentes como a esquizofrenia é, sobretudo valorizar o indivíduo em sua integralidade, que está muito além de um diagnóstico psiquiátrico.

Promover o acesso das pessoas com deficiência psicossocial no trabalho não exige grandes esforços econômicos para contratação e adequação de espaço. O espaço que é preciso adequar e que aqui se sugere, é subjetivo e vai de encontro à postura e atitudes que como sociedade, estabelecemos para literalmente incluirmos com equidade a todos. Dê espaço!

Referência Bibliográfica:

– Lei 8.213/91 Lei Orgânica da Assistência Social, Artigo 93.

– AMARANTE, P. Saúde Mental e Atenção Psicossocial, Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2013.

– Lei Brasileira de Inclusão – Comentada / Joyce Marquezin Setubal, Regiane Alves Costa Fayan (orgs,). Campinas: Fundação FEAC, 2016.

– Guia Prático para Gestores. O que você pode fazer para incluir pessoas com esquizofrenia no mercado de trabalho pela lei de cotas? – S. Paulo, 2018, Programa Inserir-Proesq (Unifesp), Luciene Redondo, Ary Gadelha Alencar Araripe Neto (orgs.).

– Nota Técnica sobre conceito de deficiência psicossocial 01/2017, Porto Alegre, Governo do Estado do Rio Grande do Sul.

– DSM-V, Artmed 2014. American Psychiatric Association.

– A Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência comentada. Brasília, 2008, CORDE.

– Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Lisboa, 2004. Tradução e revisão: Amélia Leitão.

– Conhecendo pessoas com deficiência psicossocial. Romeu Kazumi Sassaki, Rio de Janeiro, 2012.

– Instrução Normativa nº 98, de 15 de agosto de 2012. Ministério do Trabalho e Emprego, Secretaria de Inspeção do Trabalho.

– Lei 10.216/01.

Edição: CLEOdomira Soares dos Santos
Fonte: Luciene Redondo
Bacharel em Serviço Social pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas/UniFMU em 2007, Cursando MBA em Gestão Pública. Especialista em CIF pela CIF/Brasil e Unifesp; com certificação internacional (APMG, 2018) em Gerenciamento de Projetos e Programas Sociais (PMD Pro 1 e PgMD). Ministra aulas em cursos de extensão na Unifesp, Coordenadora de Projeto de Inclusão profissional para pessoas com deficiência psicossocial (Inserir-Unifesp); Responsável Técnica pelo acompanhamento social de pacientes e familiares atendidos pelo Programa de Esquizofrenia (Proesq-Unifesp). Consultora Biopsicossocial para inclusão de pessoas com transtornos mentais e assistência judiciária. Palestrante e representante dos direitos das pessoas com esquizofrenia, participando da elaboração, articulação e apresentação de projetos de lei, eventos e movimentos de defesa e garantia de direitos.

– Plano de Ação sobre Saúde Mental 2013-2020, Organização Mundial de Saúde (OMS).

– Saúde Mental e Trabalho/Organização Denise Razzouk, Mauro Gomes Aranha de Lima e Quirino Cordeiro. São Paulo: CREMESP, 2015.